Educação e a dimensão de gênero
O debate a respeito dos atributos que definem um homem ou uma mulher é controverso e repleto de armadilhas. Os conceitos de identidade e de gênero, assim como as atitudes e as inclinações sexuais a eles relacionadas, configuram-se desde o nosso nascimento, como observa Giddens (2005), e, por isso, são considerados como fatos inerentes à nossa existência. Para o autor, ao discutirmos as identidades de gênero, é necessário compreender que os termos “sexo” e “gênero” têm significados distintos e que muitas diferenças entre homens e mulheres não são de ordem biológica. Nessa perspectiva, homens e mulheres não são fenômenos naturais, isto é, não são produtos diretos do sexo biológico do sujeito.
Essa compreensão é importante porque nos permite entender que alguns comportamentos e algumas características considerados como universais e essenciais ao universo masculino e feminino são construções sociais, culturais e históricas. Portanto, não estão dados, predeterminados, nem são biologicamente definidos, mas construídos por meio das relações sociais, as quais são atravessadas por diferentes discursos, símbolos, representações e práticas.
Dessa forma, como nos explica Meyer (2008), não existe uma essência de mulher ou de homem, sendo que ninguém é naturalmente homem ou mulher, masculino ou feminino. Essas noções são construídas e aprendidas durante a nossa vida em diversas instâncias sociais, como a família, a escola, a mídia, o trabalho, a religião, o grupo de amigos, dentre outras, que moldam as nossas identidades de sexo e de gênero.
Implica pensar, também, que como nascemos e vivemos em lugares e tempos específicos, há diversas maneiras de sermos mulheres e homens, no decorrer do tempo ou num mesmo momento histórico, nos diferentes grupos e nos segmentos sociais.
No entanto, ao se rejeitar um determinismo biológico e recolocar o debate no campo sociocultural, uma vez que é nele que se constroem e se reproduzem as relações entre os sujeitos, não há uma pretensão de negar a biologia, mas enfatizar a construção social e histórica produzida sobre as características biológicas.
Entretanto, vocês podem estar se perguntando: o que essa discussão pode contribuir para o meu trabalho? O que nós, educadores e educadoras, podemos aprender com a dimensão de gênero, tendo em vista o meu âmbito profissional, as minhas relações e o meu dia-a-dia?
Essas são questões importantes, que precisam ser colocadas por nós mesmos em nosso cotidiano de trabalho. Não hás respostas prontas, certas ou erradas, mas compreendemos que discutir e aprofundar os temas relativos à dimensão de gênero permite indagar, modificar e até mesmo romper com as relações desiguais entre homens e mulheres, meninos e meninas, existentes no âmbito da nossa realidade. Assim, como nas práticas e nas ações educativas que desenvolvemos.
(...) os brinquedos e brincadeiras que proporcionamos, as atividades que empreendemos no nosso fazer pedagógico, os espaços disponibilizados a meninos e meninas, as falas de ambos, os gestos, os comentários que fazemos os olhares de repreensão ou não que lançamos a cada um deles/cada uma delas diante de seus comportamentos estão repletos de representações a respeito daquilo que entendemos ser o mais adequado para meninos e meninas, homens e mulheres. FELIPE, Jane. 06: 2008
Nessa perspectiva, compreendemos que a educação tem um papel importante a cumprir, pois, por meio de nossas práticas educativas, podemos problematizar, discutir e refletir sobre as percepções que as crianças e os jovens têm a respeito do que é ser homem e do que é ser mulher; sobre as suas representações das relações de gênero e sobre as situações, do ponto de vista da dimensão do gênero, que eles (as) vivenciam socialmente, buscando estratégias e ações de promoção da equidade de gênero nas nossas práticas cotidianas.
Precisamos, então, reconhecer como aprendemos essas coisas que fazemos e em que espaços e em que lugares aprendemos a fazê-las de uma determinada maneira e não de outras. Vamos perceber que essas aprendizagens estão incorporadas em práticas quotidianas formais e informais que nem questionamos mais. Que (...) estão imbricadas na literatura que selecionamos, nas revistas que colocamos à disposição das estudantes para pesquisa e colagem, nos filmes que passamos, (...) no vestuário que permitimos e naquele que é proibido, (...), nas piadas que fazemos ou ouvimos sem nos manifestar, nas dinâmicas em sala de aula e em outros espaços escolares que não vemos ou decidimos ignorar (...). MEYER, Dagmar Estermann. 27: 2008
Toda essa discussão leva-nos a pensar que considerar e compreender a diversidade de gênero em nossas ações educativas pressupõe questionamentos não somente nos conhecimentos e nos saberes com os quais lidamos, mas também, mudanças na nossa postura como educadores, seja na dinâmica das relações com os sujeitos com os quais trabalhamos, seja nas práticas e nas atividades diárias que desenvolvemos cotidianamente, visando contribuir para modificar o imaginário e as representações coletivas negativas sobre as diferenças.