Educação e práticas sociais

É preciso uma aldeia inteira para educar uma criança
(Provérbio Africano)

Segundo o autor Carlos Rodrigues Brandão (1985), a educação está em todos os lugares. Na vida social, vivemos a todo momento uma diversidade de práticas e de experiências que produzem um contínuo processo de socialização, assimilamos e recriamos papéis sociais, normas de convívio, códigos de conduta e valores, enfim, apreendemos a sociedade.

Desse modo, existem inúmeras educações, pois ensinar e aprender são próprios das relações que se dão na família, na escola, no campo de futebol, na praça, no museu, na internet... A educação se dá na sociedade e reflete o contexto onde ocorre.

Ninguém escapa da educação. Em casa, na rua, na igreja ou na escola, de um modo ou de muitos, todos nós envolvemos pedaços da vida com ela: para aprender, para ensinar, para aprender e ensinar. Para saber, para fazer, para ser ou para conviver, todos os dias misturamos a vida com a educação. Carlos Rodrigues Brandão (1985)

Segundo Brandão, em vários momentos da história, tipos diversos de sociedade criaram diferentes maneiras para lidarem com o saber, pois a educação é um fenômeno social, cultural e histórico. Em todas as dimensões da vida existem processos educacionais e em todos os instantes desenvolvemos ações de ensino e de aprendizagem.

Vejamos, como exemplo, os episódios a seguir, relatos de uma pesquisa feita com crianças indígenas Pataxós e nos ajudam a pensar em como a educação se dá nas relações sociais e no diálogo com o universo cultural.

Foto: Burrinho de mandioca

O cacique Soin Pataxó estava voltando da horta com um saco cheio de mandiocas que acabavam de ser colhidas. Ele chamou as crianças para mostrar um brinquedo [...]. Separam as mandiocas boas das ruins (que são as que ficariam amargas ao serem cozidas), explicando às crianças como fazer para saber qual estava ruim, pela dureza da casca ele disse:

– Essas vão para panela e essas vão para o brinquedo.

Falando com calma, cada passo da construção do brinquedo, com a ajuda de um facão ele mostrou às crianças que podem fazer com as mandiocas ‘ruins’ um burrinho para brincar. O cacique lembra, ainda, às crianças que no seu tempo de menino ela morava em Barra velha na Bahia e que esse era uns dos brinquedos de que mais gostava.

Fonte: CARVALHO, 2007

Essa experiência permitiu às crianças, ao mesmo tempo, brincar e se apropriarem de saberes, como escolher a mandioca certa para fazer brinquedos. Além disso, as crianças construíram saberes sobre a natureza e sobre o uso de seus elementos, o que consiste numa forte característica da vida na aldeia. Nas relações sociais, as crianças incorporaram à cultura pataxó, seus elementos mitológicos e valores que marcam sua relação com o meio ambiente. Veja esse outro diálogo das crianças indígenas:

As crianças brincavam de correr próximo à horta, quando se iniciou o seguinte diálogo:
Menino 1: – Você está Pisando no feijão! Saí daí!
Menino 2: – Não tinha visto, esse feijão é de Dione?
Menino 1: – Não sei de quem é, mas não vamos pisar aqui.
Quem maltrata a natureza o pai da mata pega, quem faz maldade a caipora faz perder o caminho.

Nesses exemplos, vimos como a vida social é marcada por ensinamentos e aprendizagens. Essas experiências existem em todas as esferas e práticas de nossas vidas. Nesse sentido, a educação ocorre

(...) em um complexo de experiências, relações e atividades, cujos limites estão fixados pela estrutura material e simbólica da sociedade, em determinado momento histórico. Nesse campo educativo amplo, estão incluídas as instituições (família, escola, igreja, etc.), assim como também o cotidiano difuso do trabalho, do bairro, do lazer. DAYRELL, 143: 2001

No entanto, apesar dessas evidências, ainda permanece no imaginário social a concepção de educação reduzida à educação escolar e formal. Como observa Arroyo (2001), a escola não constitui a principal fonte para a construção do projeto de vida dos sujeitos. Contudo, o correto é compreendê-la como um dos espaços e tempos educativos, formadores e culturais essenciais.

Os tempos e espaços escolares são imprescindíveis. No entanto, há outros espaços e instâncias, como o local de trabalho, os círculos de amizade, as redes sociais virtuais, os veículos de comunicação de massa e a própria convivência na cidade, no trânsito, nos espaços púbicos, onde também acontecem processos formativos.