Que tal repetir o exercício de olhar ao redor? Olhe o prédio, os espaços da escola, os cartazes que estão afixados pelos corredores e salas de aula. Olhe também os alunos em interação e como eles se dividem em grupos. O que eles conversam? Como eles se distribuem nos espaços da escola? E os colegas professores? Como é a sala dos professores? Que conversas são feitas?
Você consegue generificar o seu olhar? Vê como as relações de gênero são organizadas nas falas e nas ações de todos quando interagimos?
Algo como: “Ih, cara, não sei não, mas “cê” tá jogando água para fora da bacia” ou “isso é coisa de menina direita fazer, fulana??!!”.
Bem, veja novamente, tente identificar os espaços da escola que possuem dimensões de gênero e que indicam formas, valores, comportamentos acerca do que meninos e meninas devem fazer ou como agir em certas situações.
Creio que o que você deve ter visto na sua escola seja uma expressão do sexismo e da homofobia que atravessam as relações de gênero e, infelizmente, naturalizam o nosso olhar sobre determinados eventos. Isso nos induz a não mais perceber como ofensivas frases do tipo: “Ih, cara, conserta esse jeito de andar, que você está parecendo sei lá o quê” ou “fulana só gosta de provocar os meninos e depois corre!”.
Nessas frases, há pré-conceitos sobre como homens e mulheres devem se comportar. Mesmo que você more em uma pequena cidade ou numa cidade grande, é possível afirmar ser o machismo um dos traços de nossa cultura que tenta determinar que meninas, por exemplo, devem adiar sua iniciação sexual, enquanto aos meninos são incentivados que a iniciem. Como diz o velho ditado, “prendam suas cabritas que o meu bode está solto”. Ou seja, as meninas dos outros vão estar em risco com a abordagem do filho varão, enquanto as minhas estarão seguras. Uma relação bastante desigual sobre como pais e mães educam seus filhos e suas filhas.
Na escola, isso não é diferente. Os professores também expressam valores relacionados de como meninas devem se comportar. Muitas vezes, esses valores estão associados a várias dimensões da vida escolar.
Ou você nunca ouviu frases como:
“Os cadernos dele são um capricho só, nem parece menino. E a letra? Linda, toda redonda, parece letra de menina”?
“Hoje, os meninos vão jogar futebol e as meninas, queimada”?
E tem mais:
“Não sei não, mas o fulano é muito calado, não ‘vejo ele’ com os colegas e na hora do recreio só fica com as meninas. Aí, tem, nesse angu tem caroço!”.
“Fulana veio novamente para escola com aquela minissaia que parece um cinto de tão pequena, também, né, tal mãe, tal filha”.
No conselho de classe: “Ah, gente, esse menino não tem mais jeito, dou aula para ele desde a quinta-série e foi sempre assim. O melhor seria se ele fosse fazer um curso profissionalizante, quem sabe de torneiro mecânico”.
São frases que se repetem e, muitas vezes, sem que se percebam os conteúdos sexistas que elas reproduzem. O que fica oculto é a capacidade que elas têm em ordenar valores bem distintos para homens e mulheres e “naturalmente” dizer o que compete a um e a outro. E ainda, ao fazerem isso, subalternizam esses valores de condutas a certas prescrições que, quando violadas, poderão dar origem a graves problemas de inadequação social.
O machismo e a homofobia são dois aspectos dessa violência que atingem mais especificamente àqueles que não seguem essas normas especificas sobre o que é ser homem e mulher.