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Breve discussão sobre trabalho

Sem trabalho eu não sou nada
Não tenho dignidade
Não sinto o meu valor
Não tenho identidade
Mas o que eu tenho
É só um emprego
E um salário miserável
Eu tenho o meu ofício
Que me cansa de verdade

(“Música de Trabalho”, Legião Urbana)

A letra da música de Renato Russo parece revelar um sentimento que muitos têm em relação ao trabalho. Por um lado, ele nos realiza, principalmente quando nos identificamos com a atividade que exercemos. Além do mais, o trabalho nos traz reconhecimento, autonomia e nos põe em contato com outras pessoas e situações. Assim, um primeiro sentido do trabalho se refere ao fato de que ele é uma dimensão central da nossa condição. O trabalho, como atividade humana, é um processo de criatividade e transformação da natureza, por meio do qual o homem produz a si mesmo e a sociedade. Ele tem um sentido muito mais amplo do que apenas ser uma atividade maçante.

Por outro lado, nem sempre podemos escolher trabalhar em algo com o qual nos identificamos. Nas sociedades capitalistas, o trabalho é reduzido à sua dimensão instrumental e esvaziado de sentido. Ou seja, nem sempre trabalhamos porque gostamos ou porque sentimos prazer com a atividade que exercemos, mas sim em razão das nossas necessidades e das oportunidades que surgem para nós, oportunidades essas muitas vezes marcadas por condições precárias.

 
 

As marcas do trabalho Humano

Geralmente quando as pessoas falam de trabalho, elas destacam os aspectos negativos dessa experiência. Por que será então que o trabalho é tão importante na vida de todos? E por que os jovens querem tanto trabalhar? Uma síntese de diversos aspectos do trabalho humano elaborada pelo sociólogo Anthony Giddens (2005) pode nos ajudar a refletir um pouco sobre isso.

“Mesmo nos lugares em que as condições de trabalho são relativamente desagradáveis e as tarefas, monótonas, o trabalho tende a representar um elemento estruturador na composição psicológica das pessoas e no ciclo de suas atividades diárias. Diversas características do trabalho são relevantes nesse ponto:

1 – Dinheiro –Um ordenado ou um salário é o principal recurso do qual muitas pessoas dependem para satisfazer suas necessidades. Sem uma renda, multiplicam-se as ansiedades em relação ao modo de lidar com o dia a dia.
2 – Nível de atividade –O trabalho, em geral, proporciona uma base para a aquisição e o exercício das aptidões e das habilidades. Mesmo nos casos em que o trabalho consiste em uma rotina, ele oferece um ambiente estruturado no qual as energias do indivíduo podem ser absorvidas. Sem ele, é possível que se reduza a oportunidade de exercer tais atividades e capacidades.
3 – Variedade –O trabalho proporciona um acesso a contextos que contrastam com o meio doméstico. No ambiente de trabalho, mesmo quando as tarefas são relativamente monótonas, as pessoas podem acabar gostando de executá-las por serem diferentes dos afazeres domésticos.
4 – Estrutura temporal –Para quem tem um emprego regular, o dia normalmente se organiza em torno do ritmo de trabalho. Embora este aspecto às vezes possa parecer opressivo, ele oferece um senso de direção nas atividades diárias. Aqueles que não têm um emprego geralmente acham que o tédio é um grande problema e desenvolvem um senso de apatia com relação ao tempo.
5 – Contatos sociais –O ambiente de trabalho, muitas vezes, proporciona amizades e oportunidades de participação em atividades comuns com outras pessoas. Fora do cenário profissional, é provável que se restrinja o círculo de possibilidades em termos de fazer amigos e conhecer pessoas.
6 – Identidade pessoal –Normalmente, valoriza-se o trabalho pela sensação de identidade social estável que ele oferece. No caso dos homens, em particular, a autoestima está em geral estreitamente relacionada à sua contribuição econômica para o sustento do lar.”

(Trecho extraído do livro de Anthony Giddens, Sociologia. Porto Alegre: Ed. Artmed, 2005. P. 306.)