Cidade e educação: Duas palavras e várias relações
Como pensar a relação entre a cidade e a educação?
Imediatamente podemos fazer referência ao sistema escolar do município e sua organização. Assim, nos dedicaríamos a pensar o número de escolas, a cobertura existente, as relações de ensino e de aprendizagem, aos índices de avaliação, etc.
Podemos também pensar essa relação a partir de como os habitantes de um município cuidam de sua cidade, de suas ruas e dos espaços comuns. Assim, poderíamos averiguar, por exemplo, se há lixeiras públicas e se elas são usadas.
Essas duas dimensões, apesar de tentarem apreender o que seja a educação num determinado contexto, possuem duas visões bem distintas entre si: na primeira, a educação é enfaticamente escolar; ao passo que, na segunda, a educação é sinônima de boas maneiras.
Não que esses dois fatores não se relacionem. O importante é pensarmos em que contexto essas relações são estabelecidas e qual projeto político costura essas duas dimensões.
Um exemplo disso pode ser tirado de nossa história recente. Entre os anos de 1964 e 1984, o Brasil teve vários governos militares e um deles, o de Emilio Garrastazu Médici, lançou uma campanha publicitária cujo mote era “Povo desenvolvido é povo limpo”. Eram tempos difíceis para a democracia. Governava-se através de Atos Institucionais, em que as questões nacionais não eram discutidas, e com forte restrição à participação popular. Foi tempo também do milagre econômico e de projetos faraônicos, enquanto o povo permanecia no analfabetismo e na pobreza.
Mas havia um projeto político de educação do povo e a campanha “Povo desenvolvido é povo limpo” nos dá pista dessa relação entre educação e os territórios.
E é aí que está o "X" da questão: interessa à educação uma relação apenas formal entre escolarização e ocupação da cidade? Interessa pensar que a relação entre educação e cidade é apenas manter os meninos na escola, para que eles tratem bem a cidade e ela fique limpa? A quem interessa educar e limpar a cidade?
Essas perguntas nos exigem pensar qual o sentido político da educação, tanto em seu sentido mais geral, como mediação social e apropriação dos espaços públicos, quanto em seu sentido mais específico de projeto educacional para as escolas e a que fim se destina a educação dos estudantes.
Dizer que “Povo desenvolvido é povo limpo”, em um contexto de restrição da participação política, é empobrecer as dimensões educativas da cidade e da escola. Os vínculos educacionais cidade-escola tornam-se frágeis e não se potencializam mutuamente. E como já percebemos em nosso curso, a nossa intenção é reforçar essas dimensões e tornar a escola e a cidade espaços de mediação educacional para todos que ali moram e compartilham das mesmas experiências e, em especial, as crianças, adolescentes, jovens e adultos estudantes. Esse é o sentido que se atribui às práticas educativas que incorporam a cidade e seus territórios como espaços de conhecimento e aprendizagem da cidadania. O que pressupõe a experiência democrática ausente nos períodos de autoritarismo e de repressão política.
Flashes de viagem O lema “Povo desenvolvido é povo limpo” acompanhava uma série de inserções publicitárias no governo do General Emílio Garrastazu Médici (1969 – 1974). Os filmes eram pequenos desenhos animados em que o personagem “Sujismundo” ia emporcalhado todos os lugares em que passava. Eram filmes destinados à educação da população para o bem comum. Foram criados pelo animador e quadrinista Ruy Perottie e permaneceu no ar entre 1971 e 1972. Vejam alguns desses filminhos nos links abaixo:
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